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maio 28, 2021

Te seguirei...




Te seguirei...
(Cláudia Dimer)

Irei contigo, amor... irei agora...
Tu me serás abrigo e companhia,
Eu te serei a brisa, a calmaria,
Teremos um ao outro mundo afora.

Iremos p'ra onde o amor eterno mora...
Moraremos ao lado da alegria!
De noite a luz da lua serviria
De teto e quando dia, a luz da aurora.

Te seguirei, amor, por onde fores
e sob os nossos pés nascerão flores
Que enfeitarão de sonhos as estradas...

No calor do verão, um passarinho
Há de pousar p'ra descansar juntinho
Das nossas duas sombras abraçadas.


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maio 24, 2021

FANATISMO



FANATISMO
(Florbela Espanca)

Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim! ..."


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maio 22, 2021

À CAROLINA



À CAROLINA

Querida, ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro.

Trago-te flores, — restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos
E ora mortos nos deixa e separados.

Que eu, se tenho nos olhos malferidos
Pensamentos de vida formulados,
São pensamentos idos e vividos.

Publicado no livro "Relíquias de Casa Velha" (1906).


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maio 20, 2021

VIDRAÇA


VIDRAÇA 

Foi sem querer que abriste uma janela, 
depois fechaste para o sol de outubro. 
Quero saber, então, se diante dela, 
tu me descobres como eu te descubro. 

A gratuidade é quase cega e apela
à contundência do calor mais rubro 
para fingir o que a razão revela 
quando te cobres e eu também me cubro.
 
Os dois não somos o que desde sempre 
o sol tentou mostrar pela vidraça 
que, a contragosto, diz à luz que entre. 

A claridade, assim, não ultrapassa 
um melancólico e sombrio alpendre 
onde chorar enquanto a vida passa. 

(Rogério Camargo)
Do livro: CAPIM MODESTO


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maio 09, 2021

Cândida, És Mãe!




Cândida, És Mãe!
(Tarciso Coelho)

Oh! Flor do céu! Oh! Flor cândida e pura!
És na terra exemplo de vida e vigor
Esbanjas bondade, carinho e amor
Por Deus criada és a bela escultura

Singela, eleva-se fina e alva figura
Como flor de maior alvura e maior odor
Dando ao jardim o máximo esplendor
E à terra o maior exemplo de criatura

Última indumentária dos viventes
Ao deixares tantos mortais Carentes
Quando um dia te vestirem uma mortalha

Mas se deixas tantos sobreviventes
Ao final dirão todos os presentes
Perde-se a vida, ganha-se a batalha!

30.01.2008.


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maio 07, 2021

Se eu te fosse falar...





Se eu te fosse falar...
 (Rogério Camargo)

Se eu te fosse falar da minha vida 
 não falava metade do que posso. 
 No jogo entre a chegada e a partida, 
 sobra sempre o que é meu e não é nosso.

 Sangrando o coração de uma ferida 
 que meus orgulhos erguem do destroço, 
 eu vou e sei que vou e minha ida 
 não é uma amargura que eu adoço.

 Coloco os pés no chão e eles me doem 
 porque devem doer e são leais 
 à lei que os faz e fez e continua.

 Coloco a mão nas nuvens e elas moem 
 com a delicadeza das vestais 
 qualquer riqueza em mim que seja tua. 


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abril 25, 2021

Escrevo diante da janela aberta

I

Escrevo diante da janela aberta.
Minha caneta é cor das venezianas:
Verde!... E que leves, lindas filigranas
Desenha o sol na página deserta!

Não sei que paisagista doidivanas
Mistura os tons... acerta... desacerta...
Sempre em busca de nova descoberta,
Vai colorindo as horas quotidianas...

Jogos da luz dançando na folhagem!
Do que eu ia escrever até me esqueço...
Pra que pensar? Também sou da paisagem...

Vago, solúvel no ar, fico sonhando...
E me transmuto... iriso-me... estremeço...
Nos leves dedos que me vão pintando.

Mario Quintana, 
De: A rua dos Cataventos


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abril 24, 2021

Hora lilás...



Hora lilás...

Hora lilás, da cor desta saudade
Que não me deixa mais o coração,
Hora em que a alma toda se me invade
Só de tristeza e de desolação ...

Hora em que eu lembro a minha pouca idade
E a minha tão cruel desilusão ...
Tudo se esvai na bruma da saudade,
Essa tão doce e triste cerração ...

Hora lilás, da cor que me entristece,
Desta saudade que jamais esquece
Meu coração cansado de sofrer;

Hora em que eu vivo a vida já vivida,
Hora lilás, da cor da minha vida,
Pois é saudade só o meu viver.

Anrique Paço D’Arcos
De: Poesias Completas




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abril 06, 2021

É outono. E é Verlaine...



XXXI

É outono. E é Verlaine... O Velho Outono
Ou o Velho Poeta atira-me à janela
Uma das muitas folhas amarelas
De que ele é o dispersivo dono...

E há uns salgueiros a pender de sono
Sobre um fundo de pálida aquarela.
E há (está previsto) este abandono...
Ó velhas rimas! É acabar com elas!

Mas o Outono apanha-as... E, sutil,
Com o rosto a rir-se em rugazinhas mil,
Toca de novo o seu fatal motivo:

Um quê de melancólico e solene
— E para todo o sempre evocativo —
Na frauta enferrujada de Verlaine...


Mario Quintana
- A Rua dos Cataventos, 1940


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A NOITE NEGRA DA ALMA



A NOITE NEGRA DA ALMA

A noite negra d'alma é a agonia
do pássaro flechado no infinito;
não há regresso... O corpo se esvazia
da vida... E a morte é o santo veredito.

A noite negra é o nada... É dor... Conflito
entre a esperança e o canto de elegia...
Entre o alento e o ar, que não sacia...
Entre o sorrir do sol e o fim do dia.

A noite negra d'alma é dor perene,
é o sofrimento em rito mais solene...
É dor, a dor maior, dentro de mim!

E só resta pedir por miserere,
que o céu acalme a dor, que tanto fere...
E a paz... A paz me acolha... Sempre... Enfim!


- Patrícia Neme -


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